Sunday, October 17, 2004

38ª Parábola - O Administrador Infiel

Meus irmãos,
Para refletirmos mais detidamente sobre a parábola desta semana, vamos analisar alguns tópicos:
1) A acusação
O administrador foi acusado de estar dissipando os bens do seu Senhor. Esse administrador é a humanidade, somos nós mesmos, que estamos aqui na forma de "gerentes" do nosso próprio crescimento espiritual e os bens, que bens seriam esses? São os bens materiais, intelectuais, morais e psíquicos.
Quando prodigalizamos os haveres egoisticamente ou quando os retemos por simples avareza, estamos dissipando os bens do Senhor. O capítulo XVI de O Evangelho Segundo o Espiritismo deve ser lido, estudado e refletido com essa visão, principalmente a mensagem de Lacordaire, intitulada Desprendimento dos Bens Terrenos (item 14).
Outros bens que dissipamos são os recursos intelectuais e morais que recebemos também por empréstimo. São as potências da alma, segundo Denis, ou os prazeres da alma, conforme Hammed. Nesse sentido, somos administradores infiéis quando deixamos de utilizar para o bem nossa inteligência, nossa vontade e os demais dons que possuímos. Seria recomendável que lêssemos a mensagem do Espírito Ferdinando, Missão do Homem Inteligente na Terra, que consta do item 13, cap. VII, também do Evangelho Segundo o Espiritismo.
Mas poderemos desperdiçar ainda os bens psíquicos, quando deixamos de desenvolver e educar a sensibilidade, a intuição, a psicografia ou outro tipo de mediunidade, com vistas a nos transformarmos em instrumentos humildes porém úteis aos nossos benfeitores espirituais. No item 220, item 3, de O Livro dos Médiuns, um Espírito assim nos orienta: "...este dom (a mediunidade) não é concedido ao médium para seu deleite e, ainda menos, para satisfação de suas ambições, mas para o fim de sua melhoria espiritual e para dar a conhecer a verdade aos homens. Se o Espírito verifica que o médium já não responde às suas vistas e já não aproveita das instruções nem dos conselhos que lhe dá, afasta-se, em busca de um protegido mais digno."
Não vemos aí o Senhor retirando os bens do administrador infiel?
2) A prestação de contas
O Senhor, ouvindo a acusação, chama o administrador e pede-lhe que dê contas dos bens por ele geridos. É o caso da árvore de bons e maus frutos, conforme encontramos no capítulo XXI, de O Evangelho Segundo o Espiritismo. No item 9 desse capítulo, Erasto assim nos orienta: "...os verdadeiros profetas (i.e., médiuns) se revelam por seus atos: são advinhados..." Sugere-se, ainda, a leitura da questão de número 624, de O Livro dos Espíritos.
Todos nós temos uma missão aqui na Terra. Essa missão é necessariamente voltada para o bem e, se por qualquer motivo, não estamos fazendo o bem desinteressadamente às pessoas, é sinal de que não estamos cumprindo nossa missão. Voltando à parábola, o Senhor nos pedirá contas de nossa missão, que, de maneira quase geral, estamos deixando passar em "brancas nuvens", já que nos encontramos ofuscados pelo brilho do que é impermanente. Em outras palavras, estamos vivendo sem a preocupação do que realmente conta para a eternidade, os valores do Espírito, os tesouros que não vamos deixar na sepultura. Vale recordarmos Emmanuel: "quem não é ousado no bem, é usado no mal."
3) A estratégia
Sabendo que iria ser despojado dos bens, o que fez o administrador? Ele beneficiou os devedores do Senhor, de forma que esses o acolhessem posteriormente. Na verdade, ele agiu de forma sagaz, inteligentemente, motivo pelo qual foi elogiado pelo próprio Senhor.
Está aqui o cerne da parábola.
Os bens que administramos (riquezas materiais, intelectuais, morais e psíquicas) nos serão retirados em algum momento e deveremos prestar contas do uso que tivermos dado a cada um desses talentos, já que também assim os poderemos considerar.
No entanto, se formos sagazes, inteligentes, espertos mesmo, conforme agiu o administrador da parábola, vamos procurar os demais devedores do Senhor e vamos distribuir parte desses bens. Vamos fazer a caridade material e moral, vamos ajudar a esclarecer os irmãos e vamos desenvolver os recursos psíquicos (todos podemos e devemos aspirar por essa comunhão elevada com os amigos da Espiritualidade maior), para aliviar e consolar os que choram.
Agindo assim, cada lágrima que secarmos, cada alívio que distribuirmos, cada "Deus lhe pague" que ouvirmos nos serão contabilizados no momento da nossa prestação de contas.
É por isso que Jesus afirma na parábola: "os filhos deste mundo são mais prudentes na sua geração do que os filhos da luz." Quer dizer, filhos deste mundo são os materialistas, que, ardilosos, conseguem surpreender nas táticas e estratégias para alcançar seus objetivos. Os filhos da luz, por sua vez, são os que buscam o conhecimento espiritual. Esses, muitas vezes, são tímidos e ingênuos. Querem que a Verdade lhes caía do céu, não têm táticas (lícitas e elevadas, claro) para se permitirem os fins a que buscam. Podemos perceber, agora, a possível associação com a questão 932, de O Livro dos Espíritos.
É por isso que somos aconselhados por Emmanuel a sermos ambiciosos na prática do bem. O Chico dizia que deveríamos praticar a caridade até por inveja do vizinho que é caridoso. Em vez de ficarmos criticando os irmãos e a organização da casa espírita que freqüentamos e que abandonamos quando não somos reconhecidos e valorizados (?!), devemos "arregaçar as mangas", colocar o boné da humildade e perguntar "em que posso ajudar?" Não devemos buscar os cargos de mando, de projeção, de destaque, mas os mais simples, os aparentemente menos importantes. Também vale repetir: "o Espiritismo não precisa de nós, nós é que precisamos dele."
4) Riquezas da injustiça
Não achamos fácil compreender o porquê de Jesus nos afirmar: "...granjeai amigos com as riquezas da injustiça..." O que isso quer dizer?
O fato de estarmos presos à roda das reencarnações, samsara, nos termos orientais, tem muito a ver com a injustiça, não de Deus, que é todo bondade, todo amor, infinitamente justo e misericordioso, mas falamos da injustiça que nós mesmos cometemos, em algum ponto da nossa jornada. Toda vez que nos desviamos do caminho reto, da senda do amor, da obediência às leis de Deus, estamos nos matriculando no educandário da retificação, teremos que acertar contas com a justiça. Por mais que nos julguemos "bonzinhos, caridosos, elevados", alguma coisa em nosso passado não foi passada a limpo. O fato de nos encontrarmos neste abençoado viveiro das almas (Emmanuel), faceando dificuldades de toda ordem (principalmente as internas) é sinal de que algo fizemos e estamos apenas colhendo a justa reação (aceitemos ou não).
Dessa forma, riquezas da injustiça são os bens que adminstramos, por ocasião do nosso reajuste, conhecido por reencarnação. Granjear amigos durante o reajuste significa angariar créditos ou bônus-hora (André Luiz), que nos servirão de passaporte para situações mais felizes.
5) Fiel no pouco e no muito
Estamos aqui em trabalho de reajustamento perante as leis divinas. Na condição de devedores, somos ingratos e exigimos concessões para a quase inexistente contrapartida de merecimento que apresentamos. Alguns só faltam dizer para a Vida: "você sabe com quem está falando???"
Se nessa condição de devedores, cuja dívida, não fosse a misericórdia do credor, seria insolvível, não somos humildes e resignados, como poderemos pedir para administrar os bens maiores da vida, os grandes valores do Espírito? Ser fiéis no pouco significa reconhecermos a natureza do reajuste, do reequilíbrio na qual estamos inseridos e tratar de apressarmos essa fase de moratória (Emmanuel).
É como o caso do devedor que se alegra em pagar todas as suas dívidas, ainda que em esticadas prestações, para que ele possa passar para uma fase de investir e se capitalizar espiritualmente, se pudermos nos expressar assim.
Ser fiel no muito está reservado para uma fase em que os verdadeiros potenciais humanos serão despertados e deixaremos a fase hominal em que estamos para nos elevarmos à fase dita angelical, reservada para os Espíritos que se purificam.
6) Os dois senhores
Por mais que busquemos argumentos que justifiquem nossa "prudência" em acumular e reter bens materiais, essa fase angelical não nos estará acessível enquanto não nos desprendermos das riquezas, do apego, da ilusão, do que é transitório.
Ah, pensam alguns, mas esse estágio superior de abnegação e renúncia está reservado a criaturas especiais como Gandhi, madre Teresa ou Chico Xavier. Claro, eles passaram, em outras existências, pela fase de apego em que nos encontramos. Só assim, vencidas as barreiras que nos impedem de ver a luz, eles puderam se sublimar ou, de acordo com as palavras de Jesus, pegar a sua cruz e segui-Lo.
Enquanto adorarmos os dois senhores: o conhecimento espiritual e o apego material, estaremos na condição de pássaros com asas potentes, no entanto agrilhoados ao solo.
É assim, meus irmãos, que esta parábola (como as demais) possui tanto a nos esclarecer acerca das verdades espirituais. No entanto, se não queremos enfrentar o desafio de retirar a montanha de pedra que nos bloqueia a mente e o coração; se não queremos modificar nossas atitudes; se não optamos por estudar e colocar em prática as lições do Evangelho e da Codificação de Kardec; se não saímos do casulo e começamos a espalhar os nossos bens; enfim, se não nos dispomos a amar indistintamente a todas as criaturas, continuaremos administrando mal os bens que recebemos e a nossa prestação de contas pode acontecer bem antes do que estamos imaginando.
Muita paz a todos!
Frei Paulus

LE 932. Por que, no mundo, tão amiúde, a influência dos maus sobrepuja a dos bons?
"Por fraqueza destes. Os maus são intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos. Quando estes o quiserem, preponderarão."


0 Comments:

Post a Comment

<< Home